Apesar de saberem dos riscos, passageiros dizem que não abrem mão do serviço Em condições precárias, sem segurança e pagando uma tarifa menor. É assim que dezenas de trabalhadores seguem diariamente a viagem de casa para o trabalho, e vice-versa, num transporte coletivo irregular chamado por eles de ônibus “pirata”.
É a insatisfação com o sistema de transporte coletivo regular que tem levado estes trabalhadores a optarem por esta viagem perigosa. A pontualidade, itinerário que atende às necessidades desses passageiros e uma tarifa de R$ 2,50 são as “vantagens” apontadas por usuários para se arriscarem em uma viagem clandestina pelas ruas da cidade.
A diarista Conceição* mora na comunidade João Paulo, no Jorge Teixeira, Zona Leste de Manaus, e há oito meses segue de casa para o trabalho, na avenida do Cetur, bairro Tarumã, Zona Oeste, num ônibus “pirata”. Embora saiba do perigo, Conceição diz que foi a única solução para conseguir chegar ao trabalho em até uma hora.
“Eu sinto medo, sei que é um transporte proibido, mas é o único que faz o trajeto da minha casa até o trabalho sem eu precisar parar em dois terminais e encarar horas e mais horas de viagem”, conta.
Na tarde da última quinta-feira, 19, a equipe de A CRÍTICA flagrou um ônibus pirata e acompanhou como o motorista não se sente inibido em transportar passageiros na clandestinidade. É com usuários na escada da porta do ônibus, que vai aberta, que o motorista segue pela avenida do Turismo e é abordado por trabalhadores daquela área.
Com o itinerário que segue pelas zonas Norte e Leste, por bairros como Cidade Nova , Cidade de Deus e Jorge Teixeira, o embarque de passageiros é feito apenas na avenida do Turismo. A cada parada, até seis trabalhadores embarcam no transporte coletivo clandestino.
Pontualidade
É a partir da estrada da Cidade Nova que, aos poucos, os passageiros começam a desembarcar.
“Pra voltar para casa num ônibus de linha comum precisaria parar no terminal 3 (Cidade Nova), esperar outro ônibus para seguir até o terminal 1 (Centro) e, finalmente, pegar outro para a comunidade João Paulo. Levaria pelo menos umas três horas para voltar do trabalho”, reclama Conceição.
A pontualidade é a característica que atrai muitos usuários para esse tipo de transporte. “Sabemos que ele irá passar pontualmente. E quando o motorista vai atrasar ele avisa para alguém daqui do ponto”, acrescenta a diarista.
Durante o flagrante, a equipe de reportagem observou muitos trabalhadores correndo para embarcar no ônibus “pirata”. Durante o percurso do transporte clandestino acompanhado pela equipe de reportagem, não foi vista nenhuma fiscalização pelo caminho.
“Nunca soube de algum ônibus desse tipo que tenha sido apreendido. Mas se isso ocorrer, muita gente que o utiliza enfrentará uma longa viagem para chegar em casa e ir para o trabalho optando pelo ônibus comum”, lamentou Conceição.
A reportagem entrou em contato com a assessoria de comunicação da Superintendência Municipal de Transportes Urbanos (SMTU) em busca de informações sobre a falta de linhas regulares para a área do Tarumã, mas até o fechamento desta edição não obteve resposta.
Necessidade
Para o doutor em Planejamento de Transporte e professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Geraldo Alves, a qualidade no serviço de transporte coletivo regular - isto é, dos ônibus de linhas -, direciona a migração ou não dos passageiros para o ônibus clandestino.
“É uma relação de custo e benefício. O ônibus de linha demora a passar, os itinerários são dispersos, o usuário precisa fazer a integração nos terminais, enfrenta filas enormes nesses terminais, passa muito tempo dentro do ônibus. Estas situações apontam para um serviço de baixa qualidade que favorece essa ‘concorrência’, que cobra um valor mais baixo”, diz o especialista.
Luiz Eduardo Leal, um dos idealizadores do site TransitoManaus, que oferece o serviço de mapas com todos os itinerários das linhas de ônibus, explica que reclamações sobre o horário dos itinerários e a falta de linhas em algumas áreas da cidade são frequentes pelos usuários que contribuem com informações para a ferramenta.
“Manaus tem uma demanda muito grande de usuários de transporte público mas ainda não consegue atender a necessidade de muitos”, explica.
Fonte: acritica.com